O monitor do Centro avisa que estava uma utente "nova" para acolhimento.
Dirigi-me a ela, apresentei-me e ela respondeu:
- "não me conhece?"
Sinceramente estas questões perturbam-me.
Pois, era "Leonor" com 30 Kg a mais!
Conheci a "Leonor" em Junho de 2003, muito degradada,
andava sempre com o seu companheiro e um pequeno cão.
Resumindo a sua história até hoje:
Sem outra oportunidade a "Leonor" não terminou a 4ª classe,
teve de ficar em casa a tomar conta dos irmãos mais novos.
Aos 14 anos foi levada para Espanha para um Bar de Stripp.
Trabalhou em outros países sempre como striper.
Aos 18 anos tentou regressar a casa mas foi-lhe negada a entrada,
apesar de nunca ter deixado de enviar dinheiro para a familia.
Foi mãe pouco tempo depois e aos 19 anos iniciou consumos de cocaína e heroína.
A partir daí foi sempre a descer...
Acaba por vir para Portugal, deixa os dois filhos com uma das irmãs e
fica na rua. Arranja trabalho, passa a viver numa pensão e
pouco tempo depois é agredida por um cliente ficando com um peito massacrado.
Deixou de poder ser striper...
Iniciou o caminho da degradação total...
Em Junho de 2003 pesava 25Kg, já não tinha veias para se injectar,
gritava, chorava, desesperava com as dores da ressaca, sem conseguir injectar.
Lá foi encaminhada para programa de metadona.
Tomou durante uma semana e desapareceu.
A "Leonor" desapareceu porque foi apanhada pela PSP com 1 gr de heroína e
outra de cocaína, divididas em pacotes. Foi levantado um processo por tráfico.
Esteve detida preventivamente 6 meses, até a irmã a descobrir e arranjar advogado.
A minha questão é:
- Será possível que este país não evolui?
- Como é que uma toxicodependente extremamente debilitada, a tomar metadona,
é detida e abandonada na prisão a ressacar a frio, por carregar as suas doses?
Durante 6 meses detida, não teve qualquer tipo de apoio.
Conheço várias histórias como a da "Leonor".
Com todas as burocracias ditas legais, demorei 3 semanas para conseguir
a autorização judicial para a encaminhar para Comunidade Terapêutica.
Ficará lá a aguardar julgamento.
Fiquei aliviada de a ver partir, angustiada a aguardar a sua sentença.
Vão continuar a julgar e condenar pessoas doentes?
Quando é que isto muda?